Sai para a rua pelo meio da manhã. Depois de tantos dias cinzentões foi um novo prazer rever o sol. Coisa nova, esta saudade do grande astro, que não existe num país onde raro é um dia de chuva com pés e cabeça.
Há alguns dias tinha passado pela ilha quase frente a casa e pensado que deveria tirar por ali umas fotografias. Pois foi hoje. Já noutros anos recolhi umas imagens a partir dali e creio que é das melhores perspectivas para captar a essência de Praga. Caminhei até à extremidade da ilha, e quando a terra acabou… voltei para trás. Missão cumprida. Guardei uma boa série de imagens. E dali fui para bem longe. Apanhei o eléctrico e depois o metro para Dejvická… e depois o autocarro para Jenerálka. E internei-me no bosque.
De novo a dourada floresta de Outono. Pode começar a parecer monótono, mas não é. Pelo menos ainda não. Ver com os próprios olhos uma natureza que antes só se conhecia pelas fotografias é uma sensação única. Quando se levou uma vida inteira a desenvolver um imaginário que subitamente fica ao nosso alcance, é algo de poderoso que bate dentro de nós. A beleza destes tons dourados, por vezes a fazer lembrar cores de fogo, não tem fim. E depois, é a serenidade, a enorme serenidade.
Subo a um promontório e espera-me uma surpresa: ali está um rebanho de cabras, e o som de uma flauta que se eleva… é um pastor, como nos contos infantis, que toca para o seu público exclusivo. Ninguém parece perturbar-se com a minha presença. Os animais continuam placidamente no seu pasto ininterrupto, e a música prossegue. Deixo aquele cenário para trás e prossigo o passeio pelos caminhos secretos da mata.
Páro ao descobrir um banco banhado pelo sol, e saco do livro que ando a ler. Fico uns quinze minutos. Decido atingir um cume, e para isso saio do trilho. O tapete fofo de folhas caídas amortece-me cada passo, e após o esforço, a recompensa. Chego ao alto. Mantenho-me uns momentos imóvel, e inicio a descida, por outra vertente do monte. Descer é quase sempre mais fácil. E ali isso não foi excepção. De súbito apercebo-me de um movimento. É uma corsa que corre, foge de mim, tão perto que sinto o chão estremecer com a sua passada. Segue um caminho de terra e acompanho-a com a vista durante alguns segundos. É o segundo momento alto do dia, depois do pastor músico e suas cabras encantadas. E com isto dá-se início ao caminho de regresso. Mais uma tarde bem passada. Que o resto do dia fica reservado ao padecimento da gripe.
boas,
além da tua escrita ser extremamente cativante, tens imagens lindas.
Aproveita cada momento desse pais lindo.
beijocas