No último dia em Tetebatu e com a estadia em Lombok a chegar ao fim, hoje não havia um plano. Era deixar acontecer e eu e o Baha decidimos ir andando, até à aldeia principal, a uns 500 metros de distância. A animação por lá era muita. Quando passámos de carro não me tinha apercebido e desde que chegámos ainda não tinha surgido a oportunidade de investigar.

Gostei de ver tantas pessoas, como que um postal ilustrado animado da vida quotidiana numa aldeia indonésia. Havia lojas exploradas por chineses, não as “lojas chinesas”, mais uma espécie de venda geral, com comida e um pouco de tudo, mas não muito da quinquilharia que esperamos que nos falam de uma loja de chineses.

Como em todo o lado, o Baha fez amizades instantâneas. Sendo egípcio a língua materna dele é o árabe e na Indonésia, pelos laços religiosos, muitas pessoas vão estudar e mesmo trabalhar para países árabes, sabendo um pouco da língua.

Ao virar da esquina um grupo de rapazes em uniforme escolar caminham ordenadamente. As suas roupas não seriam muito diferentes se os visse há um século atrás. Ou talvez sim, porque as cores nacionais da Indonésia, o vermelho e o branco, estão em todo o lado e isso inclui os uniformes escolares.

Vamos andando pela estrada. A ideia é chegar a Kotaraja, uma pequena cidade, onde ouvimos dizer que há um mercado e, enfim, é o povoado de monta mais próxima. Sabemos que é algo longe, uns 6 km para cada lado, mas vamos caminhando, só porque se está bem, porque não…

 

Encontramos um cemitério, por onde passeamos. O céu está lindo, azul, com algumas nuvens a quebrar a monotonia cromática. O cemitério tem erva alta, árvores, parece ao abandono, mas é assim que é normal por aqui.

Voltamos à estrada principal onde um velhote com um carro puxado por um cavalo nos pergunta se queremos boleia. Não por generosidade, como suspeitei primeiro e confirmei depois. Mas a sugestão era tentadora, se queríamos mesmo chegar até lá abaixo, agora que o calor começava a apertar e sabendo que de qualquer forma teríamos que regressar. E lá fomos, o Baha instalado na caixa e eu sentado ao lado do homem que comandava gentilmente o animal.

Parámos à porta do mercado e lá passámos por um pequeno drama, entre o valor absurdo que ele pedia e o que  aceitaríamos pagar que mesmo assim seria muitas vezes acima do custo normal para este transporte. O Baha lidou com a situação e o caso ficou encerrado.

Mercado muito local. Intenso mas já perto da hora do fecho, com as pessoas a preparem-se para recolher as bancas. O Baha ainda comprou fruta, por um preço absurdamente elevado em relação ao custo justo, mas logo nos despachámos dali.

Queria encontrar um barbeiro e consegui. Um corte à maneira, com audiência, muita galhofa e sorrisos, um trabalho limpo sem especulação de honorários. Já não me lembro quanto paguei mas tenho a certeza que foi o que um indonésia pagaria. Só o divertimento valeria o dinheiro.

Ainda andámos por ali mais um bocado mas ficou a ideia que apesar do muito tráfego e comércio à beira da estrada, não haveria muito mais para recolher de Kotaraja. O Baha lá fez mais uns amigos, e ficaram por ali a conversar em árabe e a tirar mutuamente fotografias enquanto eu andei um pouco mais, até ter a sensação que a localidade estava a chegar ao fim. Muitos sorrisos, amabilidade na cara das pessoas.

Um homem que passava numa scooter parou para conversar comigo. Professor de inglês no liceu. Comprámos bebidas frescas e alguma coisa para comer num pequeno supermercado. E agora, para cima, de volta a casa.

Íamos andando pela estrada quando senão quando… quem havia de nos abordar a propor um transporte para cima… isso mesmo, o velhote aldrabão. Foi um fartote de rir, ria eu, ria o Baha e ria o velhote. E não é que aceitámos o novo negócio, desta vez com uma quantia acertada à partida, por causa das coisa. Assim seguiríamos até casa, poupando-nos o calor e a caminhada.

Pelo caminho ia-se rindo para as pessoas, que conhecia, claro, e dizendo algo.. imagino que fosse tipo “vejam só, enganei estes estrangeiros não uma, mas duas vezes, num só dia”. E ria, e ria! A meio parou para descarregar palha, creio que em sua própria casa. Seguimos até quase ao destino, com muitos acenos e risadas, para um lado e para o outro. E soube bem, pelo divertimento e pela boleia.

Tivemos que sair um bocado antes, porque a estrada era muito inclinada para o cavalo e a carroça. Despedimo-nos com muitas fotografias e num instante estávamos em casa.

O resto do dia foi passado nos aposentos, de forma relaxada. O último dia que passaria com o meu amigo Baha. De manhã iríamos de carro, arranjado pelo pessoal do Greenhaven Homestay, para Kuta. Ele ficaria no aeroporto, de onde voaria, e eu seguiria para a localidade, onde tinha alojamento para uma noite.

À noite estávamos lá na área comum do homestay, um deles a tocar guitarra, com uma viajante alemã, muita hormona no ar, uns rapazes que ainda não tinha visto incluídos no grupo, quando há grande agitação, luzes de carro, uma mota que chega, todos levantados em alvoroço. Chegam dois homens. Gente importante. Parece que um deles é o responsável do turismo na ilha. Parece ser algo como uma inspecção. O ambiente mudou totalmente, veneração e cerimónia. Isto entre eles. Eu e o Baha falamos na boa com os recém-chegados, que estão para ficar. Instalam-se no chão, como nós, e vamos conversando sobre a Indonésia, a ilha, o turismo… um dos manda-chuva ajeita-se com a guitarra, dizem-me que na sua juventude tinha sido cantor. Canta algo dedicado a mim, em tétum, a língua de Timor Leste, para onde lhe disse que seguiria depois da Indonésia.

 

 

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