Ah! Depois de uma chegada muito cinzenta é tempo de um recomeço, de dar uma nova oportunidade a esta cidade. Devo reconhecer que as coisas até não começaram bem. Contudo, o primeiro dia a sério na Índia foi notável. Dedicado a explorar esta cidade maravilhosa, tão afastada de todos os preconceitos formados, de todos os estereótipos. Imagino que haja partes da cidade que se aproximam daquela imagem formada, da Índia miserável, das multidões. Mas não se cruzarão no caminho do visitante casual.

A Nova Delhi que conheci é uma cidade de lides simples. O metro, para começar, permite deslocações rápidas e fáceis, e quando a extensa rede não chega, há os tuk-tuk, que se usam sem problemas, sem necessidade de regatear demoradamente os custos dos serviços. São económicos e estão por todo o lado. É só decidir que se quer ir até a outro ponto e logo se está a rolar, no interior de um destes característicos veículos.

Começou-se por uma caminhada até ao túmulo de Humayun, um dos locais mais icónicos da cidade. Não era muito longe da “nossa” casa e o passeio foi por si fascinante, à hora de ponta matinal, com muita gente a caminhar nas ruas.

O bairro onde ficamos é excelente. Mesmo como gosto. Muita vida local, ruas pejadas de comércio, de rua e tradicional. Pessoas, muitas, mas sem formar multidões asfixiantes. E foi por ali que andámos até sair para o exterior daquela vizinhança e apanhar umas vias mais largas, mas logo estávamos a chegar ao túmulo.

“Encerrado”, disse-nos um homem.  Não quis acreditar. Afinal este tipo de informação costuma estar presente em algumas golpada para turistas. Mas era mesmo verdade. Dia de encerramento, amanhã há mais.

Regressar à rotunda ali próxima e ter a primeira experiência de Tuc-Tuc. Sem problemas. Preço acordado e aí vamos pelo meio do louco trânsito de Delhi, rumo ao Arco da Índia, uma estrutura monumental, das muitas em redor do mundo inspiradas no Arco do Triunfo parisiense.

Mesmo aquela hora matinal de um dia de semana há uma multidão ali em redor. Vendedores de doces servem iguarias aos mais gulosos. Há uma cerimónia qualquer que se prepara. Camiões do exército, alguns militares graduados todos bem ataviados. Vejo bandeirinhas da Noruega. Algo se vai passar, mas não fico para ver. O arco é bonito mas não alimenta a alma mais do que uns poucos minutos.

Dali, a pé, à margem de movimentadas avenidas repletas de um trânsito sem fim. Atravessar é complicado, aliás, impossível, e é preciso aproveitar religiosamente os poucos e bem dispersos semáforos. Isto será uma permanente de toda a estadia e contas feitas estou certo que foram palmilhados muitos quilómetros nestas andanças.

Demos com o Castelo Antigo. Tudo vedado, com aspecto abandonado. Mas quando virávamos as costas percebemos que havia uma maneira de entrar nos grandes jardins que fazem parte do complexo. Há pessoas por lá. Poucos visitantes, um par de namorados, um cidadão que foi para uma caminhada. E trabalhadores. Parecem decorrer trabalhos de renovação. A entrada é pouco ortodoxa, por um segmento da rede que não existe. Alguns olhares inquiridores e nada mais.

Já do outro lado percebo. Os jardins estão temporariamente encerrados ao público para manutenção, e para visitar o interior do complexo é preciso pagar bilhete. Depois de alguma hesitação, decidimos entrar. Valeu a pena, talvez por ser a primeira experiência deste género na Índia. O local é conhecido também como Purana Qila e podem ali ser vistos diversos elementos para além das muralhas e dos trabalhos portões. Há monumentos e templos e jardins bonitos que são frequentados por muitos locais que aqui vêm (a uma fracção do preço que temos que pagar ou mesmo gratuitamente) passear, conviver e namorar. Tudo isto foi uma bela surpresa e explorar o complexo levou bastante mais tempo do que imaginei.

Dali fomos para o Khan Market. Não sabia o que esperar. Pensava em mercados de rua, numa área muito interessante, fascinante mesmo. Mas não. O Khan Market é um pedacinho de ocidentalidade em Delhi. É um dos locais onde os residentes estrangeiros vêm para sentir a carícia do seu mundo. Basicamente são 3 ou 4 ruas com lojas, de todos os géneros. Muita gente e entre eles muitos ocidentais. A tendência é clara e ao longo dos dias de Delhi confirmava-se na interacção com os condutores de tuc-tuc que assim que nos viam logo iam sugerindo “Khan Market?”.

Sem ser especialmente interessante e certamente um lugar a não regressar, a visita valeu a pena. Deu para saber do que se tratava e, se no futuro sentisse também eu aquela necessidade aguda de tocar algo vagamente parecido com a Europa, saberia onde vir.

Dali caminhámos até ao Lodi Park, cujo nome me faz sempre sorrir e pensar numa personagem de bonecos animados. Fabuloso. Ali sim. Um parque imenso, com lagos, cisnes, gente que aproveita o espaço. Os templos que ali se encontram são incrivelmente bonitos. Há muito para ver e sentir e será uma referência em Delhi que sem dúvida recomendo.

Passámos ali bastante tempo. No conjunto de templos mais importante pensei que enlouquecia: fotografava e voltava a fotografar, tomado por um entusiasmo infantil que cada vez me visita a espaços mais largos. Sei lá quantos disparos fiz. E logo nesta viagem em que usei em simultâneo telemóvel e câmara! Mas tudo tem um fim  tive que me render à aproximação da hora certa para sair do parque.

 

A próxima paragem, já com os pés a doer e o estômago a reclamar, seria o mausoléu de Safdarjung. Uma certa decepção, porque os lagos estavam vazios e um local destes sem água nos lagos perde quase tudo. Eu bem perguntei na bilheteira mas houve um certo problema de comunicação e assim foi… uma visita com desencanto e um gelado na mão. Foi o que se arranjou para enganar a fome.

Era o fim deste primeiro dia completo na Índia. Rendido a Delhi. Gosto da cidade. Senti isso num segundo momento, depois do choque da chegada. E consolidei nos dias seguintes.

Regressámos de metro. Outra surpresa. Pensei que as multidões seriam complicadas e muito desconfortáveis, mas não. A rede de metro é complexa, há linhas mais frequentadas do que outras e o fluxo varia consoante as horas, mas nunca me senti mesmo mal ao usar o metro na cidade. Um ou outro trajecto mais apertado, sem ser nada de excepcional, e apenas isso.

Nunca mais vi o meu anfitrião. A casa ficou por nossa conta, por vezes com a companhia do criado. Pode parecer uma palavra algo obsoleta, mas naquele caso não há outra. Era mesmo “o criado” do anfitrião.

Saímos para jantar e depois de algumas voltas ali por perto escolhemos um local que nos ficou no coração. “Made With Love”. Pequeno espaço, gente muitíssimo amável e comida deliciosa. Comemos  e voltámos e na última noite na Índia queríamos mesmo fazer aqui a despedida mas não deu.

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