15 de Maio de 2024
Um dos troços mais curtos da viagem pela Namíbia, desde Spitzkoppe até Swakopmund, nem chega a 200 km. Ou não chegaria, se não me metesse em aventuras. Quem ja ouviu falar da Skeleton Coast? Pois seria uma área onde queria ir, mas umas especificidades operacionais do plano para a Namíbia tinham impedido a sua inclusão. Só que… havia agora a possibilidade de ter pelo menos um cheirinho dessa zona. Para isso teria que adicionar mais uns 150 km ao plano do dia, sendo que 100 deles seriam por uma estrada de terra batida, deserta, pelo meio do… deserto.
Cheguei ao cruzamento onde decidiria. Hesitei por um breve instante e depois… que se lixe, não terei outra oportunidade. Virei para a direita, deixando de lado a via mais rápida e confortável, asfaltada.
Seguiram-se mais de 100 km por um longo estradão. Passaram alguns carros, poucos, no sentido contrário. O limite de velocidade é de 100 km/h mas em alguns segmentos circular nesse valor seria suicida. Na realidade qualquer coisa mais do que 30 km/h seria suicida. Mas rolar a 70 ou 80 km/h foi possível na maior parte da estrada.
Uma breve paragem para inspecionar uma cruz. Alguém morreu ali em Dezembro de 1991 num acidente de automóvel. Uma Susi. Fazia um vento do diabo, que em andamento não dava para perceber porque soprava por detrás.
Os quilómetros foram-se sucedendo. Uma condução agradável, descontraída. Boa disposição. Estava feliz. Afinal o caminho mais longo não era nenhum papão. Só não gostaria de ter outro furo e de facto não aconteceu.
Uns quantos quilómetros antes de chegar à estrada principal que vem de Swakopsmund para norte o estradão transformou-se e pode-se agora circular calmamente a 100 km/h. E depois o cruzamento. De forma bastante literal acabou a travessia do deserto.
Uma paragem rápida em Hentiesbay para abastecer de gasolina e usar internet de qualidade e depois para norte. O destino para o dia passou a ser Cape Cross. Ali vive uma colónia enorme de leões marinhos e encontra-se uma réplica do padrão português deixado por Diogo Cão no século XV.
O piso é agora de sal. Uma coisa diferente, compacta e potencialmente escorregadia mas muito agradável para conduzir. O mar viaja agora connosco, à nossa esquerda. Um pouco distante, a 1 ou 2 km, mas sempre presente. A temperatura exterior caiu dos 35 graus para 19 graus e o Atlântico sente-se na brisa que corre.
De tempos a tempos estão assinaladas estradas de terra batida para pontos de pesca, e pelo número de viaturas com canas de pesca com que me cruzo estta é uma actividade muito popular.
Viro numa destas estradas porque vejo ao longe uma torre. Não sei se é original ou se é uma modernice. Mas quando lá chego reconheço o local: é um camping onde considerei passar uma noite quando comecei a planear esta viagem, antes de remover a Skeleton Coast do itinerário. Mas tinha renunciado à ideia porque por mais um bocado e alcançaria Swakopmund e de qualquer forma tinha descoberto que o camping só estava aberto na época balnear.
Mas foi agradável ver o mar mais de perto e conhecer o gato local, muito simpático. Tirei umas fotos e voltei à estrada principal.
Esta é uma zona de salinas e encontrei um tanque de sal mesmo ao lado da estrada. Mais uma breve paragem.
E depois chegámos a Cape Cross. Sente-se o Atlântico, mesmo ali ao lado, muito azul, cortado pelo branco refrescante da rebentação. Encontro o portão da reserva natural, pago a entrada e depois avanço mais uns quilómetros até encontrar a colónia.
São milhares de indivíduos, espalhados pela área. A maior concentração é na espécie de praia de onde entram e saem da água. Existe um passadiço, mas um animal mais obstinado barra a entrada e ao contrário dos outros, que se afastam apressadamente à nossa aproximação, este torna-se agressivo. Por isso nada de passadiço.
Nem é preciso. Há muito para ver noutros ângulos. Andamos por ali um bom bocado, vemos as réplicas do padrão português. Chegam outros visitantes. E pronto, está visto. Agora é regressar pelo mesmo caminho, nas calmas.
A estrada é relaxante. Como sempre os condutores são exemplares e de qualquer forma o tráfego é escasso. Chegamos a Hentiesbay e dali para a frente é tudo novidade. O mar sempre ao nosso lado e de repente vejo um navio encalhado. É o Zaelia, o naufrágio que se encontra em melhor estado. Tinha-me esquecido disto, pensava que estaria mais a norte e afinal vim dar com ele. Mais uma coisa que queria ver e que acabou por ser uma surpresa.
Comprei três pedras “raras” a uns grupo de pessoas pobres que por ali andam, tirei fotografias aos restos do navio e voltei ao caminho.
Swakopsmund era o destino da jornada. Depois de uma pequena confusão encontrei a casa onde passaria os dias seguintes. Na realidade a reserva era para duas noites mas mesmo a chegar recebi uma mensagem do estabelecimento em Walvis Bay onde supostamente ficaria a seguir. Tinham que cancelar. OK. Ficou combinado com estes anfitriões uma estadia de três noites e com um pequeno valor adicional fiquei com um apartamento em vez do quarto simples.
Muita conversa depois saímos para um pequeno passeio. O mar está mesmo ao fim da rua. Isto é no centro do centro da cidade. Há um bom número de edíficios antigos, da era colonial alemã. Há também alguns chatos que repetem a conversa e tentam vender as mesmas coisas e acaba por cansar porque se sucedem.
Vamos até ao pontão. O mar está algo bravo e as vigas de madeira do piso não me inspiram confiança. Claramente estão podres e qualquer dia acontece ali uma desgraça a alguém.
Fomos jantar a um restaurante indiano. Bela comida, muito agradável e muito em conta. Comi o meu querido “butter chicken”, um belo naan de manteiga e um lassi de rosa, tudo selado com o chá massala. Isto tudo e ainda duas latas de Coca-Cola parra levar custou cerca de 12 Euros.
O serão foi para descansar. Pela primeira vez desde que cheguei tenho um serão produtivo. Até agora quando o sol se põe estou tão cansado que só espero pela hora de poder dormir, em sofrimento. Mas nesta noite as coisas foram diferentes. Muito agradável.