23 de Maio de 2024
De Luderitz até ao Quiver Tree Forest Camp são pouco mais de 300 km, um terço deles já conhecidos do percurso de chegada.
Saímos cedo, como sempre, mas desta vez não com o nascer do sol. Passamos frente à cidade mineira pouco antes das 8 horas, a hora a que abria para visitas.
Não havia muito trânsito na estrada. Os 120 km até Aus passaram num instante. A paisagem natural deste troço será das minhas favoritas de todas as que vi na Namíbia.
Lá estão os cavalos selvagens e também avestruzes. As cores vão mudando. À saída de Luderitz há um domínio do branco azulado, como um reflexo do mar, mas também relacionado com a natureza das rochas que envolvem a estrada. Depois, durante muitos quilómetros, o amarelo é omnipresente, devido aos arbustos daquela cor que cobrem a imensidão da planície.
Já à chegada a Aus as cores tornam-se mais quentes, e se o amarelo marca ainda presença é agora mais escuro, os tons do deserto são agora dominantes.
Paragem na localidade para abastecer o depósito do carro. Tal como fizemos há três dias atrás quando ainda tínhamos Luderitz para descobrir.
Daqui para a frente será uma estrada nova. E a paisagem renova-se. Ao longe vêem-se montanhas com topos planos. Vêm-me à memória imagens de velhos filmes do Oeste. Agora só falta a fileira de índios a cavalo surgir no topo daquelas montanhas.
Paramos numa pequena quinta à beira da estrada, uma pausa preciosa na viagem. Ali conversamos prolongadamente com uma jovem mulher e com outra, mais velha, mãe ou sogra. Entre elas e talvez com ajuda de mais pessoal, enchem as prateleiras da loja com deliciosos produtos caseiros de uma enorme gama. Desde cerveja de gengibre até compotas, passando por pastéis de queijo e de muitos outros recheios. Mas o Biltong – esse omnipresente petisco namibiano – é a jóia da coroa. Que aliás dá o nome ao estabelecinento: Biltongplaas.
Goageb foi um importante entreposto ferroviário mas está agora ao abandono. E como gosto deste tipo de locais saio da estrada para dar uma vista de olhos. Mas não há nada para ver, não existe ali qualquer charme. Só paredes meio destruídas.
Mais à frente uma paragem casual num velho hotel que ali existe desde a década de 30. Quase sem anos. Um sul-africano de origem alemã comprou o local logo depois da independência da Namíbia. De início distante e frio, rapidamente se abriu e começou a debitar histórias do local e da sua vida, e foi outro bocado bem passado a escutar toda aquela vivência. Diz-nos que ali mesmo pára duas vezes por semana um comboio turístico. Vem da África do Sul e é dos mais caros e luxuosos do mundo. Tem também uma quinta não muito longe. E assim vai vivendo esta última fase da sua vida.
Este foi aliás um dia cheio de contacto humano pois o nosso anfitrião para a noite tambem se vai revelar um grande comunicador. É o dono da Quiver Tree Forrest Restcamp, que encontramos a uns 15 km de Keetmanshoop. Á chegada não fiquei com uma boa primeira impressão. Mas depois do gelo se quebrar – para o que contribuiu termos um negócio de natureza semelhante e partilharmos um desamor pelos clientes chineses tudo se mudou e o senhor passou a falar pelos cotovelos.
O campsite é um pouco distante da casa principal. Montamos a tenda e voltamos para usar a internet, mas a conversa é tanta que esse objectivo fica esquecido. Volto para a tenda para relaxar um pouco e caminho na floresta destas bizarras árvores de aspecto extra-terrestre. Mais tarde a luz estará melhor mas quis fazer uma primeira abordagem.
Às 17:00 voltei à casa principal. Seria a altura em que as chitas de estimação da quinta seriam alimentadas. E lá estavam, estes gatos gigantes, no caso dois irmãos de treze anos, nascidos aqui. Descobri que chitas miam e ronronam como gatos.
Alimentadas com um generoso naco de carne para cada uma, comem civilizadamente, cada uma agarrada ao seu jantar, no seu lugar, ordeiramente. No dia seguinte, à partida, haveria de as ver de novo, um golpe de sorte, pois o seu lote é enorme, quase das dimensões do território natural que teriam na vida selvagem.
Vem aí o pôr-de-sol e é a altura de visitar de novo o campo das Quiver trees. O cenário é fabuloso e de facto foi uma bela ideia fazer aqui esta última paragem da viagem pela Namíbia. Tiro fotos como se não houvesse amanhã, a cores e pretooo e branco, de todos os ângulos e a todos os detalhes.
Cai a noite. Vou passar o serão a despachar uma série que estou a ver e que acabarei neste dia: The Gentlemen.