Como não sabíamos o que seria Trincomalee reservámos apenas uma noite no alojamento. Por um lado foi um erro, porque para o dia seguinte não havia quartos disponíveis. Mas ainda bem, porque depois foi melhor ficar no centro da cidade. Escolhemos um hotelzinho numa posição central e pela manhã lá fomos, tralha às costas, como o caracol, para mudar de casa.
O hotel foi uma bela surpresa. Era uma coisa estranha: parecia um hotel a sério em tudo mas com uma particularidade… só tinha uma mão cheia de quartos. O nosso era uma verdadeira mansão, não faltava nada. Quis logo reservar para a noite seguinte, mas o fado era este: já não era possível. Vi online. Havia disponibilidade para todos os dias menos para o que eu precisava.
Fomos então explorar mais um pouco de Trinco, começando por um outro templo hindu que me apareceu à frente; estava quase abandonado, o que lhe conferia um certo charme. Sem ninguém à vista, pude deambular por lá, vendo as coisas nas calmas, fotografando detalhes. Já no fim apareceu um homem, não me prestou muita atenção, simplesmente fez as rotinas que tinha a fazer e seguiu com a sua vida, tal e qual como eu.
Fomos espreitar o mar, de outro ângulo: a ponta da maravilhosa praia onde acabámos o dia da véspera. Aqui há pescadores, mas o areal não está sujo como o outro, o primeiro que vimos em Trinco. Vimos uma espécie de hotel, idílico, mesmo na praia. Chamava-se Dyke’s Rest, recordo-me de me ter passado pela vista nas minhas buscas no Google, com quartos a rondar os 50 Eur.
Encontramos um terceiro templo hindu. Há autocarros estacionados em frente e uma multidão de fieis que na sombra aguarda por qualquer coisa. Existe um ambiente festivo no ar, de excursão. As mulheres (porque são sobretudo mulheres) estão todas bem-vestidas, cheias de cor.
Ando por ali a espreitar e um sacerdote vê-me e chama-me. Dá-me uma pequena explicação sobre o templo, convida-me a ver à vontade e a fotografar e pede-me uma doação. Sim senhora, dou uma doação. E, sem esperar, sou recompensado com uma benção, que ganha a forma de uma pinta colorida na testa.
“Tropeço” em mais um cemitério cristão, a que não consigo resistir, mas a situação repete-se: não é especialmente interessante e inspira-me pouco, não tiro muitas fotografias, caminho apenas por um bocado por entre as campas antes de seguir caminho. Um caminho mais curto do que pensava, porque ao virar da esquina encontro um barbeiro, que era mesmo o que precisava.
Ainda estamos a meio do dia e já aconteceu tanto. Afinal estou a adorar Trinco. Muito recomendado. Bom, já que falhámos o compromisso de comparecer no grande templo, vamos lá agora, ver se ainda se passa alguma coisa. E sim, passa-se! Imagino que pela manhã tenha sido a loucura, mas mesmo assim ainda há animação suficiente, na realidade, animação no grau certo para me sentir no meu melhor.
No exterior há uma feira e muitas lojas, toda a gente a fazer bom negócio. Bom sítio para beber um coco e comprar biscoitos ou doces locais. Quanto ao recinto sagrado, passam-se tantas coisas que não conseguirei aqui descrever, até porque não as compreendo, são-me estranhas, diferentes. As pessoas executam os seus ritos de fé: os homens usam apenas um pano cobrindo as suas partes baixas, deixando as pernas expostas. Um grupo de seis músicos toca sem parar, e o seu som é recolhido por um microfone e transmitido pelos altifalantes distribuídos quase até à praia. Rapazes musculados recolhem uns estandartes vistosos que se encontravam colocados junto à entrada principal do templo. Senhoras distribuem comida. Os polícias, muitos, mantêm a sua presença discreta. Singaleses em terras Tamil.
Um espectáculo fabuloso que me manteve cativo por um longo período de tempo, encantado com as particularidades, com os detalhes, com as cores. Mas a festa estava a esmorecer, cada vez havia menos crentes e ainda tínhamos que encontrar um quarto para passar a terceira noite por estas paragens.
Passámos à porta do Dyke’s Rest, o tal para 50 Eur, e por descargo de consciência fomos perguntar, não calhasse a terem algum quarto para gente pobre por um outro preço. E não é que tinham mesmo? Um quarto interior, simples, sem casa de banho privada, mas a um preço para a nossa carteira. Ficámos de passar mais tarde a dar uma resposta, mas acho que já sabíamos que ia ser ali. Ainda vimos dois outros quartos, mais baratos, mas o encanto estava lançado. Seria no Dyke’s Rest.
Agora havia uma outra coisa a fazer: visitar o tal forte que é terra militar. Para isso encontrámos um tuk-tuk, poupando a caminhada no interior do terreno do exército. Ficámos a poucas centenas de metros do templo e lá fomos. Mais um local de culto hindu, que pela sua localização tem uma atmosfera muito própria. Construido sobre as rochas, na ponta da península, quase em cima do mar… magnifico. Vimos os altares e os macacos atrevidos que por ali andavam, vimos os produtos misteriosos que os feirantes propunham e os fiéis que visitavam o templo. A tarde estava no fim e a vida era doce.
Hora de regressar, desta vez a pé. Deu para ver os famosos veados do forte, que por ali andam à solta, em grande comunidade. Passámos junto a casernas e outras instalações militares, encontrámos velhas campas dos tempos dos holandeses, e terminámos o passeio com um chá com leite numa tasquinha junto à praia.
Hoje já não estava tanta gente. Na realidade, quase gente nenhuma. Mas em compensação estava um veado, instalado na areia, como se estivesse para ficar para a época de banhos. Deu para comer um gelado “Faluda”, ou seja, de sabor a rosa, que eu adoro. E acabou-se o dia com um jantar, cuja comida poderia ser melhor, mas pronto, foi mesmo assim um belo momento para terminar.