Acordei muito, muitíssimo cedo, com o sol que se levantava. Tinha dormido maravilhosamente. Eram seis da manhã, levantei-me, comi qualquer coisa e saí para explorar. Já me sentia muito melhor, capaz de fazer algo sozinho. Já há quase uma semana que não saía assim para a rua, para caminhar e descobrir coisas. Tinha sido em Kuta Lombok.
No exterior, uma serenidade imensa. Afastei a cadela rebelde das escadas que precisava de descer, fui andando, caminho abaixo, passando junto do local da festa, já tudo arrumado e sossegado. Não se via vivalma.
Cheguei à estrada, junto ao mar, e virei à direita. Estava ideal. Céu azul, e pela manhã a temperatura era agradável. Caminhei pelo asfalto até chegar à praia seguinte, a do Cristo-Rei, um monumento oferecido pela Indonésia após a independência final de Timor-Leste. Apesar de ser tão cedo já se vê uma ou outra pessoa a fazer desporto. Compreende-se, mais tarde o calor será abrasador.
Descubro o trilho que leva lá acima. Vou subindo, mas antes de chegar ao topo, ao monumento, opto por uma saída lateral. Trepo montes e já muito suado, a escorrer em bica, sento-me finalmente a apreciar a paisagem. Sob os meus pés estava uma terceira praia, completamente vazia, com a luz do sul reflectida nas águas e um imenso morro do meu lado direito. Momento alto.
Voltei atrás, retomei o trilho para o Cristo Rei. Lá em cima um par de varredores limpava o recinto justo ao monumento. Andei por ali, a apreciar as vistas em todas as direcções. Mais pessoas iam chegando, quase todas para a sua corridinha matinal.
Desci, e para descer é sempre mais fácil. Vim por ali abaixo em ponto morto e continuava a sentir-me muito bem, mas depois de tanto suar precisava de mudar de roupa. Estava mesmo a escorrer. É a humidade! Porque a temperatura até estava amena.
Fui portanto a casa, limpei-me, deixei-me estar um pouco no terraço a descansar, a ver a paisagem, o mar mesmo em frente e Dili já mais longe, para a esquerda. Desci pela segunda vez para a estrada. Li um bocado nas cadeirinhas da praia.
Estava na hora de ir para a cidade. Esperei pelo microbus. Em Dili a rede de transportes públicos é feita das rotas destes microbuses, umas coisinhas pequenas que andam por todo o lado, com trajectos bem definidos, rotas associadas a números, que convém conhecer.
Aqui, como estamos na periferia da cidade, é frequente que o transporte tarde. Apesar da rota terminar lá em cima, na praia, muitos condutores baldam-se a vir tão longe, até porque há poucos passageiros, e ficam-se por um ponto mais abaixo, mais próximo da cidade. Mas estava com sorte, porque pouco depois apareceu um microbus para mim.
Lá ia o condutor e o seu ajudante e uns dois ou três passageiros. Os bancos são laterais, corridos. À frente um cachecol da Seleção Nacional Portuguesa em grande destaque. O percurso é pequeno. São recolhidos mais passageiros que se dirigem para a cidade. O bilhete custa USD 0,25. Ah sim, em Timor Leste a moeda é o Dólar Americano.
Teoricamente deveria mudar de microbus à entrada da cidade, para seguir para o centro, mas depois dos dias de molho à conta da intoxicação alimentar, estou cheio de energia e decido fazer aquele segundo troço a pé. Até porque vejo logo ali um mercado que quero inspeccionar.
Na realidade não era muito interessante. Basicamente só se vendia fruta e tinha assim um ambiente como se fosse para turistas, apesar de não os haver em Timor Leste. Talvez para os residentes estrangeiros, os trabalhadores de empresas internacionais e os colaboradores de ONG’s.
Vou andando à beira-mar, uma espécie de passadiço marginal, muito cheio de timorenses que passam ali tempo de lazer. Há jovens, claramente alunos de alguma escola próxima, e no mar pesca-se. À linha e com mergulho.
Vagueio um pouco pelo centro da cidade. Vejo com mais calma alguns edifícios que remetem para a era portuguesa, como uma antiga mega-loja de chineses: Toko Lay, 1959. É o que se lê na fachada. O Liceu Dr. Francisco Machado também é evidentemente um traço daqueles tempos. E há a sede do Sport Dili e Benfica.
Levanto dinheiro num Multibanco e falo um pouco com um tipo timorense que fica deliciado por conversar um pouco em português, um homem claramente de classe média, com formação.
Penso em visitar o Museu da Resistência, mas há algo que me faz hesitar, suspeito que a exibição terá um carácter político e parcial para o qual não me sinto com paciência. Acabo por não entrar. Em vez disso vou comer ali perto uma sandes de atum empurrada por duas latas de Sundqvist.
E agora estou pronto a afastar-me do centro e caminhar até ao Cemitério de Santa Cruz, onde tanta coisa aconteceu. Por si, despido do seu significado histórico, o cemitério não é especialmente interessante. Alguns pobres homens dormem sobre as campas, gente que provavelmente não tem onde ficar e que chama de “lar” a este local. É um cemitério católico, com um pano de fundo tropical, e pouco mais o distingue de um cemitério português.
Está em curso um projecto para a criação de um memorial do massacre e de facto acho que é algo que é necessário. Quando visitei não existia nenhuma referência aos trágicos acontecimentos de 1991.
Vou regressar por outro caminho, mais direito a casa, numa diagonal. Passo junto a um dos dois hósteis que há em Dili e frente ao Centro de Estudos Xanana Gusmão onde há uma exposição que pode ser visitada. Estes quarteirões estão mais afastados do centro, onde se encontra tudo o que é mais importante na capital timorense, mas existem por aqui algumas casas antigas que merecem uma observação atenta. E coisas curiosas, como a tasca (infelizmente encerrada) que anuncia bitoques, bifanas e outras coisas assim.
Vejo um café português, este aberto, mas não entro. E por fim vou encontrar a estrada principal que corre junto ao mar. Ando até conseguir apanhar um microbus de regresso a casa. Desta vez demora um pouco mais. Como eles páram onde quer que se mande parar fui andando, devagar, na direcção pretendida, mas cheguei a um ponto que desisti e sentei-me no chão, à sombra de uma árvore.
Por fim apareceu, acho que o mesmo que apanhei de manhã, mas com outro condutor. Pelo menos tinha um cachecol idêntico à frente. O dia tinha começado cedo e acabava também cedo. Eram 13:30 quando apanhei o microbus.
Acabei por me encontrar em casa com a Katy e começou-se a falar de jantar. Decidimo-nos por uma feira de churrascos que há na outra ponta da cidade, já à saída para Liquiçá. Não sabia bem ao que ia, mas adorei o local! Super castiço! Há um enorme telhado de zinco que cobre a área onde uma série de pequenos negócios grelha a sua carne e vende bebidas. Vamos lá, escolhemos o que queremos e vamos para umas cadeiras de plástico colocadas na área para comer, junto a uma praia de pequenos seixos. Adorei o local e a carninha soube-me muito bem!
Ficámos por lá um bom bocado à conversa, até depois de cair a noite. E no regresso a casa parámos para investigar um novo supermercado. As preciosidades que lá encontrei! Depois de meses na Ásia, um chocolate Regina e uma garrafa de água da Estrela foram jóias que trouxe para casa com um imenso gosto!