18 de Janeiro de 2024

Hoje seria um dia calmo. Tinha comprado ontem um bilhete online para o Templo de Medinet Habou. A primeira experiência deste género aqui no Egipto, a ver no que daria. E correu bem. Mas o dia começou tarde. Tinha sentido alguns problemas para pegar no sono. Acho que teria dormido pela manhã dentro, se não tivesse preparado o despertador para as 10:30.

Depois da habitual ronha, lavei alguma roupa, à unha, e depois lavei-me a mim. Já mais fresquinho saí para a rua, não tive problemas em arranjar transporte por 50 Libras para lá. Um tipozinho chato e fuinha. 

Um táxi junto à mesquita local na margem oeste de Luxor

O bilhete digital funcionou sem problemas. Fiquei surpreendido pela ausência de aparato de segurança. Acho que foi a primeira vez que entrei em algum lado – mesmo no Metro – com a mochila sem a passar por um scan de Raios X. 

Quanto ao templo, é impressionante. Bem fez a minha companheira escocesa de hostel no Cairo em me recomendar este local. O bilhete é dos mais baratos, surpreendentemente. E, contudo, penso que terá sido a memória mais viva que levo dos locais arqueológicos no Egipto. Abu Simbel poderia vencer, mas depois de hesitações e mudanças de planos, e à data em que escrevo estas linhas, revelou-se demasiado distante e inacessível.

Medinet Habou oferece um pouco de tudo o que esperamos ver por aqui: imponência, colunas decoradas, pinturas milenares, estatuária impressionante. E turistas, claro. Não tantos que impeçam uma visita agradável. 

Uma turista asiática, sozinha, é abordada por um grupo de adolescentes que pedem uma selfie. E depois mais um para outra foto. E mais um, e mais um, ao que ela já vai dando gritinhos, interjeições de surpresa desagradada. E nisto é como se o céu tivesse caído ali mesmo, ou pelo menos é essa sensação que tenho quando ouço o trovejar da voz de um dos guardas, armado com uma pistola-metralhadora dos anos 50, que passa por mim como um relâmpago. Oh senhores, que grande esfrega que deu nos putos. A moça só dizia “It’s OK, it’s OK”. Mas a clemência asiática não afectou em nada a fúria do agente. 

Mais Medinet Habou

Um pouco depois a cena repete-se, agora com duas americanas bem louras. O agente está ainda mais zangado, penso que talvez sejam os mesmos putos. Fiquei a pensar. Isto deve ser uma consequência de um vídeo que há cerca de um ano se tornou viral, nas pirâmides de Giza, no qual um grupo semelhante de adolescentes pressionava de forma abusiva duas turistas – em trajes que, diga-se de passagem, eram insultuosos – para uns selfies.

Eventualmente a visita acabou. Chamei um Careem. E com alguma surpresa o meu pedido foi aceite rapidamente e em cinco minutos estava a entrar no carro do Fatih. Foi um momento muito positivo. O carro, impecável, standard europeu. E o Fatih, que dádiva! Honestidade, inglês fluente, amabilidade, profissionalismo. Não é a pessoa que associo a este serviços curtos. Imagino-o mais a ser chamado com frequência por agências para servir clientes endinheirados.

Perguntei-lhe se trabalhava no dia seguinte – que era uma Sexta-feira, o Domingo dos países muçulmanos. Que sim. E quanto me levaria, se tivesse interesse em me transportar de casa ao Vale dos Reis e de lá à Casa-Museu de Howard Carter com uma paragem nos Colossos? 10 Euros. O quê?? E eu que ponderei pagar 40 Euros por pouco mais que isto. Negócio aceite! 

O Fetih deixou-me à porta de casa com o arranjo de comparecer no mesmo ponto às 7 da manhã do dia seguinte. Muito bom.

No resto deste dia não se fez nada mais do que a descontraída vida dos meus dias de Luxor. Usufruir da minha varanda, passear por ali, parar num dos muitos cafés e restaurantes junto ao Nilo. 

Experimentei tantos. Todos quase iguais, iguais nos preços, nas opções de menu, na decoração. Bastou passarem-se uns dias e as memórias individuais, de uma forma geral, apagaram-se.

Mas sempre se esteve bem, com uma bebida, uma taça de arroz doce, a companhia dos omnipresentes gatos, do Nilo.  

Escurece cedo. A paisagem muda. Do outro lado do rio as luzes de Luxor. Na rua as coisas mantêm-se. Rega-se o piso de terra batida para evitar o pó. Pontualmente alguém oferece serviço de barqueiro. Mas de noite, todos os gatos são pardos, como se costuma dizer, e confundo-me melhor com a fauna local. 

Páro numa lojinha, compro águas, deixo os chocolates para trás. Era ali que ela estava a meter a unha. 

E um serão tranquilo, solitário, escutando os sons da vida do bairro. O galo que vai ensaiando para a hora devida, o tagarelar das mulheres que lavam alguidares de sementes, os homens em volta de uma fogueira cujas fumos me aromatizam o apartamento. 

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