Este artigo é um guia básico para quem deseje preparar uma viagem à ilha do Principe. Cobre a minha experiência, o que visitei e aprendi, mas não é um roteiro detalhado nem pretende oferecer toda a informação necessária. São mais informações essenciais, práticas, daqueles que são perguntadas todos os dias. Quanto custa, onde comer, onde ficar, que transportes apanhar e como o fazer. A informação é baseada na minha experiência em 2019.
A ilha do Principe é caracterizada pela insularidade extrema. Não só faz parte de um país composto por duas ilhas – São Tomé e Principe – como é a mais pequena das duas, com uma população reduzida e encontrando-se a cerca de 170 km da ilha principal. Isto condiciona todos os aspectos da vida (e da visita) no Principe: os bens são escassos e sempre mais caros. Há falta de tudo, de forma quase crónica. A chegada do barco é o assunto central das conversas quotidianas. Se o barco saiu de São Tomé, se vai sair, se teve um problema… e depois, quando é que as coisas chegarão ao consumidor… quando é que o combustível aparecerá no circuito comercial. Ou no mercado negro, quando é transportado de forma mais ou menos ilegal.
Do ponto de vista de quem visita este isolamento tem algumas vantagens. É um lugar remoto, tranquilo, sem crime, quase sem turistas. Vive a um ritmo ainda mais lento que São Tomé e apesar do aparecimento de novidades recentes, como o acesso generalizado à Internet, visitar o Principe é ainda viajar não só no espaço mas, de certa forma, no tempo.
Vistos
Desde há alguns anos que não é necessário visto para nós quando visitamos São Tomé e Principe por menos de duas semanas. Basta levar o passaporte.
Como Viajar até ao Principe
Antes de mais é necessário chegar a São Tomé. Para tal existem três opções com partidas de Lisboa: voar com a TAP, o que se tornou bastante desconfortável e inconveniente desde que a transportadora portuguesa deixou o formato de uma viagem semanal com aeronaves dimensionadas para voos de longo curso e passou a fazer três voos semanais com aviões mais pequenos e sem condições para a viagem, agravando-se a situação com a escala técnica no Gana. Voar com a STP, a companhia aérea de São Tomé e Principe, que basicamente oferece o serviço nos mesmos moldes em que a TAP o fazia anteriormente, com avião da White Airways (tal como a TAP chegou a fazer) de dimensões e condições adequadas a fazer um voo por semana, durante a noite à ida e pela manhã no regresso. Por fim, há a TAAG, que não aconselho pela minha experiência pessoal com a companhia angolana.
Uma vez em São Tomé existem, pelo menos teoricamente, duas possibilidades: barco ou avião. O problema é que o barco é tudo menos fiável, podendo até ser considerado perigoso pelos mais prudentes, considerando o historial de acidentes e problemas. Leva muito tempo e sai quando sai, sendo também complexo adquirir passagens. Por outro lado a ligação aérea é cara. Geralmente um pouco acima dos 200 Euros pela ida e volta. São 170 km e o voo leva pouco mais de meia-hora. O avião (e neste momento é só mesmo um) parece ser propriedade de uma empresa que penso ser ucraniana, considerando a língua dos autocolantes com instruções e do pessoal (piloto, co-piloto, hospedeira e engenheiro de bordo) que a opera.
Para consulta de horários e reservas, use o website da STP Airways. Note que existem possibilidades de um voo ser cancelado ou consideravelmente atrasado, por isso ao planear não dependa da ligação de e para o Príncipe. Espere o pior para não ficar em apuros.
Convém chegar ao aeroporto pelo menos uma hora antes da partida. Vai haver quem lhe diga para estar lá bastante antes, mas será um exagero. Uma hora é suficiente, mas não se atrase.
O aeroporto do Principe é muito simples e tem bastante charme, transportando-nos até outros tempos. Existe um barzinho e tudo é feito de forma manual, até a verificação da bagagens, no regresso.
Dinheiro
A moeda em São Tomé e Principe é a Dobra. Formalmente deverá trocar Euros por Dobras num banco. Não existem terminais Multibanco no país (até existem, mas apenas para contas nos bancos locais) nem pagamentos com cartões. Considere que terá ao seu dispor apenas o dinheiro que levar consigo. Agora, tome nota: troque o dinheiro na rua, no mercado negro. É seguro e cómodo e a taxa é melhor. Obterá 25 Dobras por cada Euro. Esse é também o referencial em transacções privadas, por exemplo, se pagar em Euros num restaurante que os aceite, deverá receber o troco em Dobras com esse câmbio.
É possível e fácil visitar o Principe sem chegar a trocar formalmente dinheiro. Vá pagando em Euros onde pode e recebendo os trocos em Dobras que depois usará onde apenas o dinheiro local é aceite. Se quiser mesmo peça no seu alojamento ou ao seu guia, se usar os serviços de um, para trocar ou para o colocar em contacto com um cambista local.
Internet e Telecomunicações
Alguns dos locais mais vocacionados para turistas, nomeadamente os que oferecem serviço de dormida, têm rede Wi-Fi gratuita. Fora isso, há pelo menos um ponto de acesso, junto ao parlamento regional, na antiga igreja ao lado do palácio do governo.
Poderá comprar um cartão SIM local, com inclusão ou não de dados móveis, existindo vários pacotes à disposição. É bastante económico e pode ser feito em duas empresas: a CST, mais antiga, e a nova Unitel. As lojas estão até bastante próximas uma da outra, em Santo António. É um processo rápido e sem burocracia.
Electricidade
O fornecimento de electricidade não é constante e segue geralmente um horário: entre as 6 e as 14 e entre as 18 e as 23. Contudo, este horário não é seguido à risca. Pode ser concedido mais tempo ou menos tempo. E podem haver apagões dentro do período em que deveria existir electricidade. Além disso, em alturas em que há escassez de combustível, o racionamento pode ser extremo. Contaram-me de situações em que só havia electricidade, dentro daquele horário, de três em três dias. A única fonte de energia eléctrica na ilha é o gerador, alimentado por combustível.
Segurança
Na ilha do Principe basicamente não existe crime. Pode-se estar à vontade e andar na rua seja a que horas for sem receio.
Transportes
Não existem transportes públicos organizados. As populações deslocam-se em viaturas próprias, a pé ou à boleia. Podem ser usados os serviços dos moto boy, táxis de mota. Mas o melhor será procurar alugar um carro. Formalmente não existem carros para alugar no Principe. Mas há quem os alugue. Um dos guias mais credenciados da ilha, o Fernando Almeida, poderá ajudar. Caso contrário, é perguntar. Perguntar ao seu anfitrião, perguntar pelos cafés. Espere pagar 60 Euros por dia, geralmente com combustível incluído. Agora, não conte com um carrinho todo janota como acontece na Europa… provavelmente terá uma viatura com muitos quilómetros de árduo trabalho em cima, eventualmente conduzirá um todo o terreno que é na realidade o carro privado de quem lho alugue, que nesse dia andará a pé.
Os dois carros que aluguei. Um num dia, o outro, no dia seguinte. Isto porque o combustível do primeiro se acabou e não existia gasóleo disponível na ilha. Consegui o segundo quase por acaso, mas serviu bem. O preço foi o mesmo, apesar de ter sido preciso algum regateio para o segundo: 60 Euros.
Alimentação
Comer é, ao mesmo tempo, simples e complicado. Ou seja, refeições fora não serão um problema, especialidade se gostar de peixe e polvo. Mas para se remediar com as suas próprias coisas será mais complicado. É muito complicado comprar bens alimentícios. A oferta é escassa e quando o barco de São Tomé se atrasa o problema agrava-se. Existe um par de mini-mercados mas as suas prateleiras podem estar quase vazias. E o que encontrar será mais dispendioso do que em São Tomé ou em Portugal. O que em principio não faltará é pão, existindo uma padaria com produção diária numa das ruas de Santo António.
Mira Rio
Esta residencial é das mais populares na ilha e tem refeições cuja qualidade pode variar. Havendo peixe, poderá ser delicioso. Um prato de febras que me foi servido estava excelente. Já o hamburger é simplesmente uma refeição para encher e seguir. Há também coisas ligeiras: sandes, tostas… coisas assim. E há sobremesas! Penso que haverá sempre alguma coisa para comer. A localização é ideal, muito central, e a sala, coberta mas ao ar livre, oferece boas vistas para o rio, sendo a única esplanada (tanto quanto sei) com esta característica. Se estiver a ficar num local sem pequeno-almoço ou se quiser variar, pode vir aqui para a refeição da manhã.
D & D
Na rua que leva desde a ponte até à igreja, o D & D tem quartos e serve refeições. Foi um dos meus pontos favoritos para comer. O pequeno-almoço é muito equilibrado, incluindo sumo natural, por um preço bastante aceitável. E tem comida. Boa oferta, para os padrões locais, com umas oito ou dez propostas. Come-se bem, por um preço agradável, sei lá, uns 8 Euros pela refeição completa. Tem Wi-Fi para os clientes e serve a cerveja mais fresca do Principe.
Barbosa
O Barbosa funciona num pequeno terraço de um velho edifício de traça colonial, mesmo em frente à igreja, do lado de lá da praça, em direcção a oeste. Muito local, com preço agradável e peixe fresco. Não espere um menu. Em princípio a refeição será peixe do dia ou… peixe do dia. Atenção ao picante, se tem um problema com condimentos tenha uma conversa com o pessoal quando encomendar. Ideal para um serão numa noite quente e sem chuva, de preferência com amigos.
Judite
Localizado numa rua mais distante do centro (o que em Santo António significa uns 400 metros) a Judite, ou Juditinha, como é conhecido, tem uma boa fama e é muito procurado. Pessoalmente não experimentei, porque não sou dado a comer peixe e peixe do dia é o que aqui encontrará. Preços em linha com as outras opções existentes em Santo António, com uma refeição entre os 6 e o 8 Euros.
Alojamento
O alojamento mais económico em Santo António vale 30 Euros por um quarto de casal. Disseram-me que é possível ainda mais barato, mas tenho alguma dificuldade em acreditar, tendo visitado os quartos em questão… parece-me demasiado bom para ser verdade. As pensões geralmente alugam a uns 60 Euros. E depois há o luxo, de que nem vou aqui escrever: o Bom Bom, a roça Sundy e a roça belo Monte.
Santa Casa da Misericórdia
Foi a minha escolha. Reservada com a ajuda do guia local, Fernando Almeida. Não existe nenhuma forma de reservar online. Só contactando directamente. O telefone é o 00239 9906559. O valor de um quarto duplo, quando visitei, era de 30 Euros. Casa de banho partilhada, sem pequeno-almoço, mas desde recentemente com ar condicionado e wi-fi, grandes novidades. Para quem gosta de uma viagem mais genuína, é um mimo. Muito interessante falar com os velhotes que passam a manhã aqui, no centro de dia, e ver a obra desenvolvida. A localização é ligeiramente marginal, mas isso em Santo António é irrisório. Serão uns 400 metros até ao centro.
Mira-Rio
Uma das pensões de Santo António, muito bem localizada, com alguma oferta no que toca a alimentação e oferecendo a melhor esplanada da povoação. O valor dos quartos andará pelos 60 Euros, incluindo pequeno-almoço. Nesta gama seria a minha escolha. Fica mesmo no centro, junto ao rio Papagaio, mas com a igreja ao virar da esquina.
Residencial Apresentação
Uma pequena pensão na esquina da localidade, onde o rio Papagaio encontra as águas do oceano na tranquila baía. Fica basicamente em frente à Santa Casa, mas do outro lado do rio. Deve ser bastante tranquila, mas percebe-se que não explora a sua localização, estando isolada da paisagem por uma vedação.
Residencial D & D
Localizada a umas dezenas de metros da Mira-Rio é também muito central e tem um dos melhores locais para comer da cidade. Bons quartos, para os padrões do Principe. Surge no Booking.com a 50 Euros, mas no local falaram-me em 20 e poucos Euros… talvez seja uma questão de contactar directamente e discutir valores. Talvez os quartos virados para a rua sejam ruidosos, apesar de não haver grande movimento em Santo António. Fora isso, será uma boa escolha.
Residencial Palhota
Não visitei esta residencial nem conheci ninguém que lá tivesse ficado, mas passei à sua frente várias vezes. A localização é boa, mas estando junto à principal entrada em Santo António será uma estadia provavelmente menos tranquila do que noutras opções existentes na povoação. E se o interior estiver como o mal tratado exterior do edifício será melhor manter-se afastado.
Seja como for, poderá ver no Booking.com a lista completa de possibilidades, incluindo as opções de luxo (mas excluindo a Santa Casa). Está aqui tudo. E não esqueça, se reservar seguindo este link, o Cruzamundos recebe uma pequenina contribuição, que é sempre muito apreciada.
Santo António
A encantadora Santo António é uma pequena cidade, que dizem ter sido considerada pelo Guiness Book como a capital mais pequena do mundo (procurei bastante e não encontrei nada no website do Guiness Book sobre isto). Localiza-se junto a uma enseada, de posição muito criticada pela sua vulnerabilidade a ataques humanos e das águas do mar, que no passado invadiram as suas ruas.
O que ver
Santo António é uma pequena cidade, um título que deve ao seu estatuto de capital do Principe, pois se assim não fosse pouco mais seria do que uma grande e relativamente bem ordenada aldeia. Existem vários pontos de interesse, mas o simples caminhar pelas suas ruas é por sim uma actividade aconselhada. Não existe crime nem assédio ao visitante. As suas vias são tranquilas e pitorescas, se bem que limitadas em extensão e número.
Ruas de Santo António
Cirandar pela cidade é das coisas mais interessantes para aqui se fazer. Há sempre algo de novo para descobrir, um pormenor, uma loja peculiar. E gente. Simpática, antipática, indiferente. Como em todo o lado.
Se passar mais de um dia na “cidade” deverá ter tempo para percorrer, literalmente, todas as ruas do centro, deixando as áreas residenciais e periféricas de fora. Olhos bem abertos, observe as velhas casas da era colonial, algumas ao abandono, outras convertidas em habitação quando não o eram. Espreite as lojas antigas, um par delas ainda em funcionamento, com o tosco balcão de madeira e a mercadoria acumulada em rudimentares armários.
Há alguns elementos que se destacam, devidamente abordados mais abaixo: a igreja de Nossa Senhora do Rosário e o que a rodeia, como os bancos debaixo da árvore e em redor da pequena rotunda, onde as pessoas que vieram à cidade procuram boleias para as levar de volta às suas comunidades. A praça Manuel da Veiga, que foi e é o centro político da ilha, com o palácio e a assembleia provincial instalada numa antiga igreja, dotada com um bem cuidado jardim público. Há-de se chegar ao cemitério de Santo António e, ao lado, ao estádio, que marca o final da área urbana.
Para o outro lado, o nascente, encontra-se o porto, onde se chega depois de se passa pela rotunda do padrão de Santo António. Ali próximo encontra-se a antiga sede do Sporting Clube do Principe e o padrão colocado no velho cais que ameaça ruir. É por aí que se sai da cidade em direcção ao aeroporto, ao Bom Bom e à roça Sundy.
Igreja de Nossa Senhora do Rosário
O principal edifício religioso da ilha é a Igreja de Nossa Senhora do Rosário, localizada no centro de Santo António. Trata-se de um pequeno templo católico, cujas portas estão abertas a crentes e visitantes ao longo do dia. O seu interior é simples mas bem cuidado, oferecendo um ponto de repouso agradável a quem trilha as ruas de Santo António, especialmente quando o calor aperta e o fresco da nave se sente como uma carícia. Ficha da igreja no HPIP.
Cemitério de Santo António
No fim de uma rua sem saída, já na periferia da povoação, apesar de a curta distância do centro, vamos encontrar o cemitério. Poderá ou não encontrá-lo aberto, mas certamente não será complicado encontrar o guardião, caso dê com o portão encerrado.
É um espaço amplo, que se encontra geralmente limpo de matos. Existe uma capela no seu centro e diversas plataformas onde se encontram as campas. Na sua maioria os túmulos são relativamente recentes, mas podem ser vistos alguns bem antigos. Mesmo. De tal forma que as inscrições se lêem com dificuldade.
Praça Marcelo da Veiga
Neste espaço, antiga Praça da Matriz, que passa por centro de Santo António, encontrará o antigo palácio do governador, hoje sede do governo regional, assim como a Assembleia Regional, instalada numa antiga igreja, local onde existe Wi-Fi gratuito como se pode atestar pelas pessoas que se aglomeram junto às janelas durante o serão. Atente no marco do correio, à velha moda portuguesa, localizado frente a estes dois edifícios.
No centro da praça existe um pequeno jardim público bastante bem cuidado.
Porto
O porto do Príncipe é um simples pontão, mas nos dias de ócio que aqui poderá passar poderá dar aqui um salto e observar as andanças, especialmente se tiver acabado de chegar o barco de São Tomé. Aproveite para ver também o edifício da alfândega, mesmo em frente. Antes de lá chegar, mesmo antes da estrada que vira nesta direcção, note o edifício que, pelas suas características, acredito ser a antiga capitania do porto, da época portuguesa. Ali junto existe um antigo pontão, muito periclitante, onde se pode avistar uma interessante réplica dos padrões das Descobertas.
Estádio Regional 13 de Junho
Santo António está dotado de um recinto para a prática do futebol de qualidade surpreendente. Considerando o clima pouco propício para o desporto e a a reduzida população da povoação e mesmo da ilha, foi uma surpresa ver um amplo estádio, com um relvado sintético impecável. Poderá encontrá-lo fechado, mas talvez seja apenas uma questão de empurrar a porta certa.
As bancadas e as estruturas de apoio tem um estilo que parecem indicar uma construção portuguesa. É um local habitualmente tranquilo onde poderá sentar-se um pouco a olhar o infinito e imaginar os momentos que aquelas pedras já viram.
O estádio localiza-se na periferia de Santo António, na estrada que, do lado do rio onde se encontra o centro, se afasta em direcção a sul… não que vá longe, como longe não irá estrada alguma no Principe. Ali defronte fica um dos locais onde à noite se pode ir beber um copo e dançar.
Praça do Padrão de Santo António
À saída da cidade, antes de se iniciar a subida que leva até aos pontos mais importantes da ilha, fora de Santo António, encontra-se uma rotunda. No seu centro pode-se ver o Padrão de Santo António. Bem visível ali mesmo está o edifício devoluto do Sporting Clube do Principe, ainda pintado de verde e ostentando o símbolo do leão.
Igualmente próximo – impossível não ver – existe aquele que na minha opinião é o edifício mais bonito da localidade, talvez mesmo da ilha. Creio tratar-se da sede do Parque Natural. É uma casa plena de charme, totalmente recuperada, com uma das fachadas viradas para a baía.
Praias
Como referi, o que se segue não é um guia exaustivo das praias da ilha mas apenas uma referência às que conheci, que na realidade foram apenas duas. Pessoalmente não reconheço às praias do Principe a fama que têm, quando comparadas com as de São Tomé. Continuo a preferir a praia Piscina, no sul de São Tomé, à praia Banana, tida como uma das mais belas do mundo. Minha opinião, minha preferência.
Praia Banana
Esta praia tornou-se relativamente famosa nos anos 70, quando aqui se rodou um anúncio do rum Baccardi (podem ver aqui o anúncio). Hoje em dia o acesso é condicionado, estando numa área controlada pela empresa turística da roça Belo Monte. Talvez seja uma coisa boa. Pelo menos na minha época favorita para visitar a região, Novembro e Dezembro, pouca gente visita. Desci duas vezes à praia. Numa das vezes estavam umas pessoas, na outra, ninguém. E assim a estrada é mantida em condições aceitáveis. Ainda há pouco tempo a descida era penosa, podendo ter que ser feita a pé. Mas agora o estradão está impecável, para os padrões locais, sendo acessível em viatura todo o terreno, mesmo por condutores inexperientes neste tipo de terreno. Além disso, existe um agradável bar de praia e uma série de estruturas (poltronas, redes, mesas) que se integram no ambiente, debaixo das árvores à beira do areal.
A Praia Banana tem este nome devido à sua forma, idêntica à do fruto. Passando-se a portaria da roça deve-se seguir a estrada que está bem indicada em direcção à Praia Banana. Em caso de dúvida, perguntar ao guarda. Vai-se rolar por algumas centenas de metros até chegar ao encantador miradouro de onde se pode ter a melhor perspectiva da praia. É um lugar tranquilo que me agrada imenso. Ideal para relaxar, ler um pouco, fazer um piquenique. É um ponto sobranceiro sobre o mar, vendo-se o areal da Banana do lado esquerdo.
Dali para a frente é sempre a descer. E depois é desfrutar da praia. Devo dizer que me parece mais bonita ao longe do que bem de perto. Não é tão abrigada como gostaria e como disse há melhores opções para nadar e fazer praia. Mas mesmo assim é imperdível.
Note-se que nas imediações existem duas outras afamadas praias: a praia Macaco e a praia Boi. O acesso faz-se também a partir da roça Belo Monte, seguindo a bifurcação que se encontra mesmo antes da portaria. Contudo, na altura em que visitei o piso estava muito mal tratado, exigindo perícia e paciência ao condutor.
Praia Bom Bom
A praia Bom Bom nem sempre assim se chamou. Antes da chegada do HBD, um grupo sul-africano detido por um milionário que um dia, ao voar sobre a ilha, quis saber mais e acabou por se apaixonar pelo Príncipe, a praia tinha outro nome. Praia Coco. Mas agora as coisas mudaram e ir à Bom Bom é dar um salto a um pedacinho de “civilização”, um refúgio para “brancos”, onde [quase] tudo funciona bem e há electricidade mesmo quando não a há no resto da ilha.
A zona do Bom Bom é composta por duas belas praias, esta e a Santa Rita, mesmo ao lado, pelos bungalows de alegado luxo (não me impressionaram muito, certamente não tanto que entenda o preço que ali se paga pela dormida), pelo bar-restaurante e pelo ilhéu, onde existe uma estrutura de apoio com espaços comuns para hóspedes e uma sala de refeições. Estes últimos elementos não pude visitar porque durante a minha estadia a ponte de madeira que leva até lá esteve em reparações.
É uma praia agradável, relativamente extensa, beneficiando do apoio das estruturas do resort. Existem equipamentos que podem ser usados livremente por qualquer visitante, não sendo necessário ser ali hóspede. Falo, por exemplo, de pranchas de paddling e material de snorkeling.
Para quem tem um carro e não se sente aventuroso, esta será provavelmente a praia com melhores acessos desde Santo António. Boa parte do caminho é asfaltado e o restante é mantido em boas condições. E é um percurso interessante, com um toque de vida local e de natureza tropical.
Praia de Santa Rita
Encontra-se junto à Praia Bom Bom e uma grande parte do que foi escrito para aquela aplica-se à de Santa Rita. Apesar de menos conhecida é talvez melhor, mais reservada, com apenas dois bungalows virados para o seu areal, e logo no início. Em dias de muito calor as árvores que em determinado ponto da praia se debruçam sobre a areia oferecem uma sombra refrescante. E, se caminhar um pouco, poderá relaxar enquanto escuta os sons da selva, especialmente se for ao nascer do dia ou pela hora do pôr do sol.
Outras Praias
Claro que existem outras praias em São Tomé. Mas não serão tão facilmente acessíveis, em termos de estrada. É o caso das bonitas praias Boi e Macaco, com estradões em muito mau estado, que se acedem desde a entrada da Roça Belo Monte, não se localizando muito longe da Praia Banana.
A sul de Santo António poderá tentar a sua sorte na Praia Abade, aproveitando para visitar a Roça Abade. A leste da Praia Banana uma estrada conduz até à praia da Burra. Consegue-se passar com calma, desde que se tenha um veículo todo o terreno, mas junto a esta praia vai encontrar uma comunidade piscatória… não diria que seja um bom local para fazer praia. Entre os olhares das pessoas que ali vivem, pouco amigas de visitas, de forma geral, e a bicharada (cães, porcos galinhas) que por ali anda… será melhor escolher uma das outras opções.
Uma palavra para a praia Sundy. Existe por lá uma extensão da roça Sundy com alojamento a preços de luxo. Mais de 500 Euros por noite, por um bungalow na praia. Disseram-me que existe acesso em condições, o que faria sentido, mas pessoalmente não o encontrei. Da sede da roça há um trilho íngreme e longo que é por si um trekking com alguma exigência, especialmente no regresso e considerando o calor e a humidade.
Roças
As Roças são ou eram unidades agrícolas, plantações de grandes dimensões que formavam a espinha dorsal de São Tomé e Principe até à independência. Depois de 1975 muitas delas colapsaram, tornando-se aldeias, ou comunidades, como ali se chamam. As populações ocuparam as estruturas que anteriormente eram da empresa agrícola, como as residências dos administradores, os hospitais e as escolas, que com o passar dos anos e à falta da adequada manutenção se tornaram em pouco mais do que ruínas.
Algumas roças lograram contudo manter-se funcionais, produzindo os produtos de sempre, nomeadamente café e cacau. Outras foram convertidas para fins turísticos. Em São Tomé existem roças convertidas com preços e conforto para todas as bolsas mas no Principe as que assim funcionam são bastante caras.
Sundy
Esta será porventura a roça mais emblemática da ilha, talvez devido à forma peculiar das antigas cavalariças, que se assemelham à muralha de um castelo.
A roça deve o seu nome ao rio que ali passa e que no passado era conhecido como Sumdim. O seu proprietário foi Jerónimo José Carneiro e chegou a ser a segunda maior roça da ilha, empregando quando 600 trabalhadores. O seu principal produto era o cacau, mas produzia também mandioca e frutas, como banana, coco, manga e papaya.
Logo à entrada, mesmo antes de franquear a portaria que protege o núcleo da roça, poderá ver do lado direito o antigo hospital. À data da minha visita as instalações estavam bastante mal-tratadas, mas podia-se explorar livremente, deixando correr a imaginação e observando pormenores como as antigas latrinas, cozinha e refeitório. Do lado oposto da estrada, o campo de futebol, circundado por habitações.
O edifício da administração é agora parte do complexo hoteleiro da Sundy, merecendo uma visita no exterior e no interior. Ali perto encontramos a capela da roça (se quiser visitar o interior peça a chave) e a famosa “muralha” com um torreão e guaritas que é uma das imagens mais icónicas da ilha. Apesar da sua monumentalidade tratava-se apenas da fachada das cavalariças da Sundy.
De próximo da capela de Nossa Senhora da Penha de França parte um trilho, longo e íngreme, que conduz à praia Sundy. O piso é fácil, mas a inclinação tornará o regresso fisicamente exigente, especialmente em dias de mais calor.
Do lado esquerdo do edifício principal encontra-se o local onde em 1919 o físico Artur Eddington levou a cabo uma experiência com a finalidade de comprovar a Teoria da Relatividade, de Albert Einstein.
Não perca o Espaço Ciência Sundy, inaugurado pelo presidente da República Portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa. Trata-se de um pequeno espaço museológico onde se encontra diversa maquinaria agrícola antiga
Belo Monte
A roça Belo Monte é de passagem obrigatória para qualquer visitante do Principe, quanto mais não seja, porque serve de porta de entrada para a praia Banana e, de certa forma, para as praias Macaco e Boi, cujo acesso se inicia logo antes do portão da roça.
Na portaria encontrará um guarda. Não se atemorize, o acesso é livre. Cumprimente as pessoas e aprecie a visita. Logo depois chegará à entrada do quartel-general da roça, que se assemelha com um forte de outros tempos. Entra-se passando por um portão encimado por um sino. Na estrutura está gravada uma data: 1922.
Esta roça é hoje uma unidade hoteleira de luxo. Mas é a sua segunda incursão neste ramo, pois no passado, pouco depois da independência, um abastado empresário tinha sonhado com o estabelecimento de um hotel ali. Investiu, iniciou a recuperação dos edifícios. Segundo reza a história ter-se-á perdido de amores por uma estrangeira que visitava a ilha e com ela desapareceu para não mais voltar.
Pode-se ali parar para beber uma bebida fresca com vistas sublimes. Existe uma piscina, que poderá estar funcional ou não. E uma excelente exposição, com painéis cobrindo uma série de aspectos relevantes do Principe, que vale a pena visitar.
Paciência
A Roça Paciência será encontrada a caminho da Roça Belo Monte e das praias Banana, Macaco e Boi. Das três que visitei é a única que não foi recuperada para turismo de habitação, existindo ainda alguma exploração agrícola.
Sabe-se que após a independência do país esta roça foi concessionada a um português, pessoa que segundo se diz era muito popular entre os habitantes locais. Não sabendo se ainda isso se verifica, o grupo HBD, o mesmo que gere a Sundy e o Bom Bom, levava aqui a cabo uma prova gastronómica, a Rota dos 4 Sabores, com produtos de cacau, baunilha, café e coco incluídos na degustação. Falava-se na possibilidade de também a Paciência vir a ter uma unidade de alojamento do HBD, mas até à altura em que visitei isso não se verificava.
O epicentro da roça é o amplo terreiro, em redor do qual se agrupam, em razoável estado de conservação, a casa do administrador, os armazéns e os pavilhões de seca do cacau. O hospital fica mais abaixo. Até à independência funcionava nesta roça um rudimentar sistema ferroviário, que ligava a sede a partes mais distantes, como a Praia das Burras.
Outras Roças
Existem diversas roças na ilha que não visitei. É o caso da distante Roça Ponta do Sol e da ainda mais distante, abandonada há muito, Roça Infante Dom Henrique, à qual se pode aceder apenas com um guia e depois de uma caminhada significativa, encontrando-se esta última em pleno Parque Natural. Uma palavra ainda para as roças Bela Vista, Nova Cuba, Abade e Terreiro Velho, esta última facilmente alcançável de carro e que constitui a porta de entrada para o Parque Natural, usufruindo-se de grandes vistas no caminho.
Outras Fontes de Informação sobre a Ilha do Principe
Poderá adquirir, até para São Tomé, o Guia Turístico São Tomé e Principe, um belo livro, em formato pouco ortodoxo, mas que é sem dúvida a melhor fonte de informação para quem visita o país, a nível mundial. E tem uma secção para o Principe. Claro. Tem sido actualizado desde que surgiu, em 2013, e no momento em que escrevo estas linhas vai na terceira edição. Para adquirir será melhor contactar directamente o pequeno editor através do Facebook: Pocket Tropics.
Desaconselho o Bradt Guide de Sao Tome and Principe. Achei um guia inócuo, muito pobrezinho, feito em cima do joelho, por alguém que não compreendeu a essência do local e que se centra nas paranóias de segurança a todos os níveis.
Online não existe muita coisa. Pode ver aqui as páginas dedicada ao Principe do blogue Bichinho das Viagens. O Filipe Morato Gomes publicou uma entrevista interessante a alguém que vive (ou viveu) no Principe que poderá gostar de ler aqui. A Rute viajou muito em São Tomé e Principe, sempre de bicicleta, e passou bastante tempo no Principe. Pode ler o seu diário de viagem.
Olá boa Tarde.
Obrigado pela reportagem…muito completa.
Vou em Junho 18 dias para São Tomé e Principe,penso que serão dias a mais,mas vou para descanso,com calma.
Quantos dias aconselha a ficar no Principe,para aproveitar sem pressas e poder interagir com as pessoas.
Obrigado.
Boas viagens.
Raúl
Olá amigo Raul,
18 dias é uma escolha estranha em primeiro lugar pela questão do visto. Mas de forma geral, sendo a terceira vez que visito, considero duas semanas o período ideal para uma viagem com tempo para descansar e ver tudo o que é de mais relevante. Três dias completos no Principe, no máximo quatro, a partir daí é outra coisa, já não é viajar, é passar tempo, viver no Principe em pequena escala. Em meio dia explora-se a vila com todo o detalhe. A partir daí é visitar roças e praias, talvez uma caminhada na natureza se o meu amigo for dado a práticas físicas. Ora tendo em conta que as roças e as praias aqui não são especialmente diferentes das que existem em São Tomé e que tudo é mais caro e complicado…….
Olá Ricardo:
Foi com grande emoção e alegria que viajei pelas suas palavras acerca desta ilha.
A Ilha do Príncipe:muito que gostaria de ter lá ido quando vivi a segunda parte da minha juventude na cidade, da ilha onde nasci, em São Tomé mas mais a minha mãe tinha um grande pavor de viajar em aviões pequenos, de meia dúzia de lugares e de barco ainda menos…sem haver um porto marítimo.
Gostei das imagens fotográficas que comprovam pelas suas belíssimas praias, ainda ser a Ilha do Príncipe mais bonita do que a Ilha de São Tomé. Um potencial de recursos que continua a não chegar a toda a gente, infelizmente!
Infelizmente ou felizmente. A liberalização das maravilhas naturais arrasta sempre consigo um elevado risco de as subverter e lhes retirar a tal maravilha.