Este é um daqueles livros que nos oferece a possibilidade de viajarmos não só no espaço mas também no tempo.
Ao lê-lo, estaremos a atravessar África, desde a sua extremidade meridional até ao Cairo, prosseguindo, como se de uma extensão da história se tratasse, até Chipre, Grécia e, por fim, Londres.
E fazemo-lo numa outra época. Quando não havia internet e muito menos dados móveis. Quando não existia AirBnB, horários de autocarros online ou TripAdvisor. Numa era em que cada dia de viagem era uma aventura, o inesperado aguardava para a qualquer momento surpreender o viajante.
Adoro estas narrativas de viagem que nos transportam nestes dois vectores. E Drifting Through Africa é perfeito.
A viagem tem lugar entre 1979 e 1980. O seu autor é um jovem sul-africano, com tiques de hippie, ferozmente anti-apartheid, vegetariano e ávido fumador de brocas. Infelizmente para o leitor é também um pródigo gerador de testosterona, e esta é uma das fragilidades do livro: ao longo da viagem sucedem-se as aventuras sexuais, quase sempre breves, presentes, efémeras. Nada demais, já tive vinte e tal anos, sei como é, mas se estivesse a escrever uma memória de viagens não seria tão exaustivo na narrativa destas situações. Creio que não trazem um valor acrescentado ao livro.
O outro aspecto que me desagradou, ligeiramente, é a distribuição da rota pelas páginas disponíveis. Num instante chega-se à Tanzânia e faltando ainda um quinto de livro já se saiu de África.
Por outro lado a narrativa é maravilhosa. Informal mas com pontuais laivos literários. Muita aventura, muito sumo para retirar das memórias desta viagem. Improvisos, apuros rocambolescos, detenções pela polícia, momentos idílicos, coincidências inacreditáveis, surpresas agradáveis e desagradáveis, descrições riquíssimas.
Richard viaja com um orçamento muito limitado, dorme onde pode, come quando pode. Por vezes beneficia da inesperada ajuda de estranhos que encontra ao longo do caminho. Enfrenta a hostilidade de outros. Faz amigos, a tempos viaja na companhia de companheiros de estrada.
Move-o, para além da fome de aventura, um objectivo bem definido: chegar a Inglaterra e conhecer a terra dos seus antepassados. Lá espera-o um tio, com quem ficará por tempo indefenido após a chegada.
Em suma, um verdadeiro livro de viagens, estranhamente ignorado pelos leitores: practicamente não existem comentários ao livro na Amazon ou na Goodreads. Gostei bastante desta leitura, que me entreteve em Maio de 2022. Na realidade já há algum tempo que não lia com tanto gosto, virando as páginas com naturalidade, sem esforço, sempre a pensar na oportunidade de descobrir mais uma série das aventuras do Richard Smale.
Note que pode comprar o livro para Kindle na Amazon.com ou impresso em papel na Amazon espanhola.