A rubrica Momentos baseia-se em situações especiais vividas pelo vosso amigo Cruzamundos. O artigo de hoje é um pouco diferente porque narra algo que não testemunhei. Pelo menos em corpo, porque em alma, foi como se estivesse lá estado. Praga é assim, está ligada a mim por um elo invisível. Sinto-a a cada momento, as suas dores e alegrias. Por isso e porque esta história me tocou tanto, decidi inclui-la neste espaço.
A ideia tomou forma na mente de Ondrej Kobza. De seguida o proprietário do popular Café V Vese recorreu ao sistema de “crowd raising” para obter as verbas necessárias. Adquiriu cinco pianos e colocou-os em espaços públicos da cidade de Praga. O objectivo? Pôr as pessoas a tocar, espontaneamente. De início as reacções não foram encorajadoras. Muita gente acusou Ondrej de ser um extravagante e a multidão não aderiu. Depois, lentamente, as coisas mudaram. Os pianos começaram a ser usados. De fiasco, a iniciativa passou a sucesso. Ondrej passou a receber pianos oferecidos ou cedidos. As ruas de Praga receberam mais destes instrumentos musicais. Um mês depois, no início de Outubro de 2013, já eram doze. Actualmente são dezenas.
Nos tempos que passam não estou em Praga e sofro por não poder testemunhar estes momentos. Mas amigos meus falam-me de experiências incríveis, como a face extasiada de uma pobre “sem-abrigo” que passa horas a deliciar a multidão com os seus recitais. Ou a senhora que, tocando alegremente, põe um par de ciganas a dançar ao seu ritmo. Mas os pianos de Praga tornaram-se internacionalmente conhecidos quando uma jovem checa colocou no Youtube um pequeno video que mostrava um polícia de giro sentado ao piano interpretando o tema “River Flows In You”. O filme tornou-se viral e a cena foi abordada pelos grandes jornais desse mundo fora. O Telegraph inicia a sua peça dizendo que uma sociedade pode ser considerada primordialmente pacífica quando os seus polícias se sentam uns instantes durante a ronda para uma brincadeira musical. E eu concordo.
Ver um agente da autoridade sentado a um piano extraindo melodiosas notas do instrumento musical enquanto o seu parceiro assiste, com um sorriso meio embaraçado, e a multidão passa e vai olhando com sorrisos divertidos é algo que não imagino suceder em Lisboa. Nem existiriam pianos, quanto mais polícias dados às mestrias da música. As miúdas que filmam terminam a sua produção com um entusiasmado “OBRIGADO!”. É o que eu sinto em relação a Praga. Obrigado, obrigado por seres o que és!